21 setembro 2014

Esqueci-me de tomar o pulso esta manhã.


Feita a rotina normal, tudo colocado no sítio, pela ordem correcta e seguindo a ordem correcta, falhou-me esse detalhe na rima do soneto que tem sido a minha vida nos últimos anos. Acabou por ficar sem a sua chave d'ouro, sem a sua conclusão fulcral para que pudesse ser entendido, e o Mestre não vai gostar. Mesmo que a explicação seja a mais racional, mesmo que não use a Desculpa, ou até mesmo a Razão Máxima, como tanta vez ouvi dizer, o Mestre não vai gostar. De todo o meu tempo em funções, nunca vi parceiros meus, terem esta falha perdoada ou até mesmo esquecida ainda que com um "Log Diário" perfeito, jamais se perdoa a falha de "Tomar O Pulso"! Tanta norma cumprida hoje, quase a totalidade do registo próprio feito, classificado e mesmo assim, falhou-me o elo de ligação para todo e qualquer tipo de interpretação da minha existência. Imagino a cela onde pernoitarei durante um ano pelo menos, a goteira a martelar no chão, os ratos que serão meus companheiros enquanto as minhas extremidades lhes servirão de alimento, a poça criada pelo caldo de suor de quem é coagido achar-se merecedor de tal destino. Esperam-me meses de reflexão, ditados mentais de louvor ao Mestre, o doloroso procedimento de auto-aprendizagem, silogismo para um numero diário e variável de chicotadas auto-inflictas, a par com a vociferação de agradecimentos pela oportunidade oferecida. Agradecerei o meu sofrimento enquanto processo de aprendizagem, louvarei a quem me permite aprender a não falhar da mesma forma. "Escapou-me", direi com medo do castigo que me espera, tentarei não pensar no caminho para o cadafalso, farei um esforço por manter a serenidade, quando cairem as faixas vermelhas ao longo do corredor que me conduz ao que sei que me espera. Porque raio me fui olvidar do pormenor mais importante do "Log Diário"? Apontei o ritmo de crescimento capilar, o nível de temperatura por volume corporal, os torques tendonais, a coloração dentária e a espessura pelicular das unhas, e não registei o pulso? O Mestre ensinou-nos que não há culpas, mas sim responsabilidades, e por isso dever-lhe-ia ser imputada a responsabilidade de todavia não ter magicado uma forma de extrapolar o pulso com base nos nossos registos. Eventualmente colar-nos um mecanismo complexo, como só o Mestre sabe fazer, que fizesse tudo isso e nos libertasse para o resto das actividades. O Mestre não se engana, nunca o vi enganar-se e de todos outros Peões que soube terem falhado, jamais vi algum arrependido do que passou na Sala de Consolidação. Pelo contrário vi-os sairem mais fortes e convictos da sua missão e importância. Quem sabe é isso mesmo o que me falta para passar a Peão Primário. Convicção. .... Convenci-me que afinal o mestre é quem tem a razão.